terça-feira, 18 de outubro de 2016

Folhas Secas

Eu estava dando uma aula de Matemática e todos os alunos acompanhavam atentamente. Todos?
Quase: Carolina o apontador na ponta da régua, Lucas recolhia as borrachas dos vizinhos e construía um prédio, Renata conferia as canetas e os lápis do seu estojo vermelhíssimo e Hélder olhava para o pátio.
O pátio? O que acontecia no pátio?
Após o recreio, dona Natália varria calmamente as folhas secas e amontoava e guardava tudo dentro de um enorme saco plástico azul. Terminando o varre-varre, dona Natália amarrou a boca do saco plástico e estacionou aquele bafuá de folhas secas perto do portão. Hélder observava atentamente. E eu observava a observação de Hélder - sem descuidar da minha aula de Matemática. De repente, Hélder foi arregalando os olhos e franzindo a testa,
Qual o motivo do espanto?
Hélder percebeu alguma coisa no meio das folhas movendo-se desesperadamente, com aflição, sufoco, falta de ar. Hélder buscava interpretações para a cena, analisava possibilidades, mas o perfil do passarinho já se delineava na transparência azul do plástico. Um pássaro novo tinha caído do ninho e, confundindo-se com as folhas secas, foi varrido e agora lutava pela liberdade.
-Ele tá preso!
O grito de Hélder interrompeu o final da multiplicação de 15 por 127. Todos os alunos olhavam para o pátio. E todos nós concordamos, sem palavras: o bico do passarinho tentava romper aquela estranha pele azul. Hélder saiu da sala e nós fomos atrás. E antes que eu pudesse pronunciar a primeira sílaba da palavra "calma", o saco plástico simplesmente explodiu, as folhas voaram e as crianças pularam de alegria.
Alguns alunos dizem que havia dois passarinhos presos. Outros viram três passarinhos voando felizes e agradecidos. Lucas diz que era um beija-flor. Renata insiste que era uma cigarra. Eu, sinceramente, só vi folhas secas voando.
E, para concluir esta inesquecível aula de Matemática, pegamos vassoura, pás e sacos plásticos e fomos varrer novamente o pátio.


Conto de Francisco Marques (Chico das Bonecas). Revista Nova Escola. Novembro de 1990.


Como utilizar o texto em sala de aula:

  • Trabalhe  o conto no pátio, que é o centro de convivência da escola. Ou use uma sala que dê para ele.
  • Antes de levar a sala para lá, crie uma atmosfera diferente. Arranje folhas secas e cubra o chão com elas. Se dispuser de aparelho de som, escolha algumas músicas para recepcionar o grupo que chega ao pátio para a atividade. A música deve continuar até todos se acomodarem em seus lugares.
  • Outros materiais que você deve providenciar antes do dia da aula:
  • Dois sacos plásticos azuis cheios de folhas secas.
  • Uma cesta contendo cópias de dois trechos do conto de Chico quantos forem seus alunos. O primeiro trecho deve ir do do início até "Qual o motivo do espanto?"; o segundo, de "Hélder percebeu" até o final. Imprima os textos dentro de retângulos lembrando janelas.
  • Uma caixa de papelão encapada contendo papéis coloridos recortados na forma de folhas.
  • Cartolina ou papel pardo para a conclusão do trabalho.
  • Elementos a serem trazidos de casa pela turma: papéis de vários tipos, cores e tamanhos; cola, tesoura, algodão; tampinhas de garrafa, macarrão, botões e, claro, uma boa quantidade de folhas secas!
  • Comece pedindo aos alunos que descrevam, em uma só palavra, aquilo que sentem ao olhar pela janela da sala de aula. Essa palavra deve ser escrita numa das "folhas" colocadas por você na caixa.
  • Divida a classe em grupos de cinco e  ou seis membros. Entregue a cada participante uma cópia do primeiro trecho do conto. Depois de ler e reler o texto, cada equipe escreve, em conjunto, um final para a narrativa.
  • Findo o texto, diga aos grupos que elaborem uma dramatização do conto. Enquanto eles preparam sua performance, você pode pôr uma música de fundo.
  • Discuta o trabalho feito pela classe, sem esquecer a diversidade de finais, com todos sentados em círculo. Feito isso, distribua a segunda metade do conto, avisando que ninguém deve lê-la até que todos tenham recebido sua cópia. Enquanto isso, uma nova música pode sublinhar o momento de curiosidade: como termina realmente o conto? Com o som em volume baixo, leia o conto inteiro, enquanto eles acompanham nas cópias o que você diz. Terminada a leitura, deixe a turma fazer seus questionamentos, suas comparações e conclusões. Ajude-a fazendo perguntas como: "- Como foi o relacionamento entre a turma e o professor de Matemática naquela situação?" "-Será que aquela aula foi mesmo 'perdida'? Por quê?" "-Será que abrimos nossos olhos - verdadeiras janelas interiores - para novas perspectivas e descobertas?" "Por que as folhas recolhidas no pátio por D. Natália exerciam tanto fascínio sobre Hélder?"
  • Recite para a classe o primeiro verso diz:"Cada palavra, uma folha / no lugar certo". Lance à sala questões como:"-Não serão palavras as folhas secas do conto de Chico dos Bonecos?" "-Não teria sido essa a amaneira simples e delicada que o autor encontrou para nos passar um momento de pura alegria, com o que parecia apenas folhas secas transformando-se em vida?" "-E, justamente em vida de pássaro, um símbolo incontestável de liberdade?" "-Não estaria a ideia de liberdade outra vez presente na explosão do saco plástico, fazendo surgir o pássaro em meio às folhas secas que voam?"
  • Finalize o trabalho fazendo uma colagem em que as crianças utilizarão os materiais que trouxeram de casa para expressar coletivamente em forma de desenhos, poemas ou outros meios as conclusões e os sentimentos que ficaram do texto de Francisco Marques.




sábado, 15 de outubro de 2016

Feliz Dia dos Professores!

Qualidades do professor

Se há uma criatura que tenha necessidade de formar e manter constantemente firme uma personalidade segura e complexa, essa é o professor.
Destinado a pôr-se em contato com a infância e a adolescência, nas suas mais várias e incoerentes modalidades, tendo de compreender as inquietações da criança e do jovem, para bem os orientar e satisfazer sua vida, deve ser também um contínuo aperfeiçoamento, uma concentração permanente de energias que sirvam de base e assegurem a sua possibilidade, variando sobre si mesmo, chegar a apreender cada fenômeno circunstante, conciliando todos os desacordos aparentes, todas as variações humanas nessa visão total indispensável aos educadores.
É, certamente, uma grande obra chegar a consolidar-se numa personalidade assim. Ser ao mesmo tempo um resultado - como todos somos - da época, do meio, da família, com características próprias, enérgicas, pessoais, e poder ser o que é cada aluno, descer à sua alma, feita de mil complexidades, também, para se poder pôr em contato com ela, e estimular-lhe o poder vital e a capacidade de evolução. E ter o coração para se emocionar diante de cada temperamento.
E ter imaginação para sugerir.
E ter conhecimentos para enriquecer os caminhos transitados.
E saber ir e vir em redor desse mistério que existe em cada criatura, fornecendo-lhe cores luminosas para se definir, vibratilidades ardentes para se manifestar, força profunda para se erguer até o máximo, sem vacilações nem perigos. Saber ser poeta para inspirar. Quando a mocidade procura um rumo para a sua vida, leva consigo, no mais íntimo do peito, um exemplo guardado, que lhe serve de ideal. Quantas vezes, entre esse ideal e o professor, se abrem enormes precipícios, de onde se originam os mais tristes desenganos e as dúvidas mais dolorosas!
Como seria admirável se o professor pudesse ser tão perfeito que constituísse, ele mesmo o exemplo amado de seus alunos!
E, depois de ter vivido diante dos seus olhos, dirigindo uma classe, pudesse morar para sempre na sua vida, orientando-a e fortalecendo-a com a inesgotável fecundidade de uma recordação.



Texto de Cecília Meireles, extraído do livro Crônicas de Educação 3.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Pelo Otimismo

Olhando alguns artigos aqui nos meus "guardados" encontrei um pequeno trecho bem inspirador. Espero inspirar seu dia hoje!

Como indivíduos e como cidadãos, temos perfeito direito a ver tudo na cor característica da maior parte das formigas e de grande número de telefones antigos, ou seja, muito preto. Enquanto educadores, porém, não nos resta outro remédio senão ser otimistas, infelizmente. Educar é crer na perfectibilidade humana, na capacidade inata de aprender e no desejo de saber que há coisas (símbolos, técnicas, valores, memórias, fatos,...) que podem ser sabidas e que merecem sê-lo - e que nós, homens, podemos melhorar uns aos outros por meio do conhecimento. De todas  essas crenças otimistas podemos muito bem descrer privadamente, mas se queremos educar ou entender em que consiste a educação não há outro remédio senão aceitá-las. Com verdadeiro pessimismo pode-se escrever contra a educação, mas o otimismo é imprescindível para estudá-la... e para exercê-la. Os pessimistas podem ser bons domadores, mas não bons professores.



Trecho de "Carta á Professora", prólogo do livro O Valor de Educar (Ed. Martins Fontes), do espanhol Fernando Savater

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Defenestração

Certas palavras têm o significado errado. Falácia, por exemplo, devia ser o
nome de alguma coisa vagamente vegetal. As pessoas deveriam criar falácias
em todas as suas variedades. A Falácia Amazônica. A misteriosa Falácia
Negra.
Hermeneuta deveria ser o membro de uma seita de andarilhos herméticos.
Aonde eles chegassem, tudo se complicaria.
– Os hermeneutas estão chegando!
– lh, agora é que ninguém vai entender mais nada…
Os hermeneutas ocupariam a cidade e paralisariam todas as atividades
produtivas com seus enigmas e frases ambíguas. Ao se retirarem deixariam a
população prostrada pela confusão. Levaria semanas até que as coisas
recuperassem o seu sentido óbvio. Antes disso, tudo pareceria ter um sentido
oculto.
– Alô…
– O que é que você quer dizer com isso?
Traquinagem devia ser uma peça mecânica.
– Vamos ter que trocar a traquinagem. E o vetor está gasto.
Plúmbeo devia ser o barulho que um corpo faz ao cair na água.
Mas nenhuma palavra me fascinava tanto quanto defenestração.
A princípio foi o fascínio da ignorância. Eu não sabia o seu significado,
nunca me lembrava de procurar no dicionário e imaginava coisas.
Defenestrar devia ser um ato exótico praticado por poucas pessoas. Tinha até
um certo tom lúbrico. Galanteadores de calçada deviam sussufrar no ouvido
das mulheres:
– Defenestras?
A resposta seria um tapa na cara. Mas algumas… Ah, algumas
defenestravam.
Também podia ser algo contra pragas e insetos. As pessoas talvez
mandassem defenestrar a casa. Haveria, assim, defenestradores profissionais.
Ou quem sabe seria uma daquelas misteriosas palavras que encerravam os
documentos formais? “Nestes termos, pede defenestração…” Era uma palavra
cheia de implicações. 
Devo até tê-la usado uma ou outra vez, como em:
– Aquele é um defenestrado.
Dando a entender que era uma pessoa, assim, como dizer? Defenestrada.
Mesmo errada, era a palavra exata.
Um dia, finalmente, procurei no dicionário. E aí está o Aurelião que não me
deixa mentir. “Defenestração” vem do francês “defenestration”. Substantivo
feminino.
Ato de atirar alguém ou algo pela janela!
Acabou a minha ignorância mas não a minha fascinação. Um ato como este
só tem nome próprio e lugar nos dicionários por alguma razão muito forte.
Afinal, não existe, que eu saiba, nenhuma palavra para o ato de atirar alguém
ou algo pela porta, ou escada abaixo. Por que, então, defenestração?
Talvez fosse um hábito francês que caiu em desuso. Como o rapé. Um vício
como o tabagismo ou as drogas, suprimido a tempo.
– Les defenestrations. Devem ser proibidas.
– Sim; monsieur le Ministre.
– São um escândalo nacional. Ainda mais agora, com os novos prédios.
– Sim, monsieur le Ministre.
– Com prédios de três, quatro andares, ainda era admissível. Até divertido.
Mas daí para cima vira crime. Todas as janelas do quarto andar para cima
devem ter um cartaz: “Interdit de deffnestrer”. Os transgressores serão
multados. Os reincidentes serão presos.
Na Bastilha, o Marquês de Sade deve ter convivido com notórios
defenestreurs. E a compulsão, mesmo suprimida, talvez ainda persista no
homem, como persiste na sua linguagem. O mundo pode estar cheio de
defenestradores latentes.
– É esta estranha vontade de atirar alguém ou algo pela janela, doutor…
– Hmm. O impulsus defenestrex de que nos fala Freud. Algo a ver com a
mãe. Nada com o que se preocupar – diz o analista, afastando-se da janela.
Quem entre nós nunca sentiu a compulsão de atirar alguém ou algo pela
janela? A basculante foi inventada para desencorajar a defenestração. Toda a
arquitetura moderna,
com suas paredes externas de vidro reforçado e sem aberturas, pode ser uma
reação inconsciente a esta volúpia humana, nunca totalmente dominada.
Na lua-de-mel, numa suite matrimonial no 17o andar.
– Querida…
– Mmmm?
– Há uma coisa que eu preciso lhe dizer…
– Fala, amor.
– Sou um defenestrador.
E a noiva, em sua inocência, caminha para a cama:
– Estou pronta para experimentar tudo com você. Tudo! Uma multidão cerca
o homem que acaba de cair na calçada. Entre gemidos, ele aponta para cima e
balbucia:
– Fui defenestrado…
Alguém comenta:- Coitado. E depois ainda atiraram ele pela janela!
Agora mesmo me deu uma estranha compulsão de arrancar o papel da
máquina, amassá-lo e defenestrar esta crônica. Se ela sair porque resisti.
Comédias para se ler na escola Luís Fernando Veríssimo
Sugestão para trabalho em aula:
O texto é ideal para abordar o neologismo. Algumas palavras do texto não fazem parte do vocabulário dos alunos. Sugiro que façam duas listas das palavras menos conhecidas e as procurem em um dicionário e uma outra lista com as mesmas palavras, porém, com outros significados. O educador pode escolher junto com os alunos as mais criativas e montar uma exposição.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

O olhos de vidro do meu avô


  Meu avô imaginava sempre, eu acreditava. Vencia as horas lerdas deixando o mundo invadi-lo por inteiro.   Ele hospedava essa visita sem espanto. Saboreava o mundo com antiga fome. O que seu olho de vidro não via, ele fantasiava. E inventava bonito, pois eram da cor do mar os seus olhos. E todo o mar é belo por ser grande demais. Tudo cabe dentro da sua imensidão: viagens, sonhos, partidas, chegadas, mergulhos e afogamentos. Há que se contar o desassossego que as águas nos provocam. Nunca soube se meu avô conhecia o mar. Sua cidade ficava bem no meio das minas. Sei que morava entre um mar de montanhas, um mar de paixão e um mar de dúvidas. E devia ser sem tamanho o seu olhar de vidro. Ele parecia conhecer até o depois dos oceanos. […]
   Dizem que ele viajou para São Paulo. Naquele tempo, São Paulo ficava quase em outro país. Foi comprar esse olho que não via. Ele jamais acreditou que, em terra de cego, quem tem um olho é rei.
   Venceu longos dias de estrada, poeira, lama, fantasiado de pirata, como se fosse carnaval. Tudo para conquistar um olho. Meu avô era vaidoso, mesmo sem desejar ter reinado.
Voltou com dois olhos, mas apreciando a paisagem apenas com o lado direito. Pelo olho esquerdo ele só adivinhava. Um olho era de mentira e o outro era de verdade. Mas isso não lhe trazia problemas. Cego é aquele que não quer ver. Ele via muito. Tudo no mundo é, em parte, uma verdade e, por outra parte, uma mentira.
   Com o olho direito do meu avô via o sol, a luz, o futuro, o meio-dia. Com o olho esquerdo ele via a lua, o escuro, o passado, a meia-noite. Um dia me falaram que a alma tem dois olhos. Com um, ela olha para o tempo, com o outro, ela namora a eternidade. Um olho é do amor e o outro do desamor. Mas eu não conhecia a alma. Sei que se fosse boa ia morar no ceú. Se fosse má, estaria, para sempre, no caldeirão do inferno. Aprendi isso no catecismo.

Bartolomeu Campos de Queirós . O olho de vidro do meu avô. São Paulo: Moderna, 2004. p. 6-8.


Sugestão de atividades

1. O avô fez uma viagem.
a) Para onde ele foi?
b) Por que ele viajou?
c) Como foi a viagem?
d) Explique a frase: “São Paulo ficava quase em outro país”.
e) Ao longo da viagem, o menino afirma que o avô estava “fantasiado de pirata, como se fosse carnaval”. Explique o motivo.

2. O avô, que antes tinha apenas um olho, retorna à cidade com dois olhos. Como eram esses olhos?

3. A diferença entre os olhos refletia os modos de o avô ver o mundo. Explique essa afirmação.

4. Leia as frases a seguir.

I- Precisava enviar depressa o e-mail, mas o computador estava lerdo.
II. Passos lerdos soaram nas escadas.
III. Tocava a boiada, mas alguns animais estavam lerdos, preguiçosos, e atrasavam a viagem.

a) O adjetivo lerdo poderia ser substituído nas frases, com as flexões ncessárias, por duas das palavras listadas a seguir. Identifique-as:

esperto lento interessante vagaroso educado

b) Reescreva as três frases fazendo a substituição do adjetivo assinalado por sinônimos, isto é, palavras de sentido equivalente.

5- Explique o sentido da seguinte passagem do texto:

“Vencia as horas lerdas deixando o mundo invadi-lo por inteiro.”

6. Releia a passagem completa.

“Meu avô imaginava sempre, eu acreditava. Vencia as horas lerdas deixando o mundo invadi-lo por inteiro. Ele hospedava essa visita sem espanto. Saboreava o mundo com antiga fome.”

a) De que visita fala o narrador?
b) O que o avô saboreava: uma fruta? Um doce? O mundo?

7. No texto são citados alguns provérbios populares. Agora, analise a seguinte passagem e responda.
“Ele jamais acreditou que, em terra de cego, quem tem um olho é rei.”

a) Destaque o provérbio popular e explique o seu significado.
b) Por que o narrador diz que o avô não acredita no provérbio?

8. “Tudo no mundo é, em parte, uma verdade e, por outra parte, uma mentira.” Com esta frase, o narrador amplia o sentido da experiência do avô.

a) Destaque do texto palavras e expressões que mostrem as diferentes visões do avô para cada olho.
b) O que era verdade e o que era mentira quando o avô olhava o mundo?

9. O texto é uma narrativa de memórias.
a) Quem é o narrador?
b) O texto é narrado em 1ª ou 3ª pessoa? Comprove, exemplificando.
c) Marque a resposta certa.
Os fatos narrados acontecem.
I. ao mesmo tempo que o narrador conta a história.
II. antes do tempo em que o narrador conta a história.
III. depois da narrativa; o narrador faz uma previsão para o futuro.
d) Toda narrativa se caracteriza por uma transformação principal. Qual é o grande acontecimento narrado que provoca uma transformação?
e) O narrador não conta uma história apenas. Faz também considerações e comentários acerca do que ocorre. Explique.

10. O texto é uma Autobiografia. Auto significa “de si mesmo”; biografia é a narrativa da história da vida de uma pessoa.
a) O que significa autobiografia?
b) A partir da leitura, identifique as características do gênero autobiografia.



Texto retirado do Projeto Apoema da Editora Moderna.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Ti, o pica-pau avisador


 Antigamente, quando o senhor Santo Ildefonso andava por aqui fazendo os trabalhos de Deus na Terra, ficava temeroso de que acontecesse alguma coisa aos filhos quando estivesse longe. Por isso, encarregou o pica-pau Ti de ficar tomando conta deles e avisá-los do perigos.
 O passarinho passou a fazer isso muito bem. Por qualquer coisa, voava para junto dos meninos, pousava no ombro de um deles e cantava:
 - Ti-ti-ti-ti...
 Eles já sabiam. O passarinho não estava só dizendo o seu nome. Estava era avisando de algum risco. Então, tomavam cuidado e se defendiam. Por isso, nunca tinham problemas.
 Santo Ildefonso ficou muito satisfeito. Para recompensar o passarinho Ti, fez que ele tivesse uma plumagem bonita. E também o ajudou para que nunca lhe faltasse comida. Ensinou-o a bater com o bicona casca das das árvores, cavando buraquinhos para poder pegar as lagartas e outros insetos que se escondessem lá dentro.
 Então, o passarinho passava os dias nas árvores apanhando comida para os filhotes:
 - Toque-toque-toque...
 Mas, quando era preciso avisar os filhos de Santo Ildefonso, já se sabe. O pássaro Ti ia lá, pousava no ombro de um deles e cantava:
 - Ti-ti-ti-ti...
 E eles se preveniam contra os problemas.
 O pica-pau fazia seu trabalho tão bem que o santo resolveu ser generoso e dividir os avisos de perigo com todo mundo. Disse ao passarinho:
 - Ti, você agora fica encarregado de voar por perto das estradas e veredas, avisando aos caminhantes quando houver algum perigo. Assim, eles podem se cuidar.
 O pássaro Ti passou a fazer isso, sempre muito bem. Pousava no ombro de quem passava e cantava:
 - Ti-ti-ti-ti...
 Era só o caminhante tomar cuidado e não acontecia nada de mau.
 Mas os filhos do senhor Santo Ildefonso não gostaram nada da novidade. Não queriam dividir com ninguém os avisos do pica-pau. Por isso, um dia, quando Ti chegou, os meninos cuspiram nele.
 O passarinho voou até a casa onde estava Santo Ildefonso e contou:
 - Senhor santo, veja só o que seus filhos me fizeram. Maltrataram-me e cuspiram em mim. E cuspe de gente deixa passarinho manchado. Olhe só como minhas penas ficaram todas salpicadas de saliva.
Santo Ildefonso olhou e disse:
 - Não posso fazer nada para consertar sua plumagem. Mas vou castigar meus filhos. De hoje em diante, eles não vão mais se livrar de nenhum perigo e vão ter muitos problemas. E você pode cuidar só da vida de seus filhotes. Nunca mais precisa avisar ninguém de nada.
 Por isso, até hoje, o pica-pau Ti tem as penas bonitas, mas sarapintadas. E sabe muito bem procurar comida debaixo da casca das árvores.
 Por isso, também, as pessoas correm riscos e têm problemas. Mas, às vezes, o passarinho se lembra de seus tempos de avisador e canta, embora nunca mais tenha pousado no ombro de ninguém. E até hoje, pelas estradas de Chiapas, o caminhante atento e devoto toma cuidado quando ouve o pica-pau Ti no meio de uma viagem, pois sabe que pode ter contratempos pelo caminho.


Conto inspirado numa lenda do povo tzeital, de Chiapas, no México, adaptado por Ana Maria Machado.


Como utilizar o texto em sala de aula

Para as séries iniciais

Difícil, nessa fase, é prender a atenção das crianças. Para evitar dispersões, peça que desenhem a história enquanto você faz a leitura do texto em voz alta. Com um detalhe: os alunos não podem tirar o lápis do papel. Divertida, a atividade estimula a concentração e a percepção da narrativa e possibilita melhor fluência de ideias. Experimente, depois, comparar os desenhos. Haverá, com certeza, diferenças e semelhanças interessantes entres as releituras. Nas aulas de Educação Artística, ensine a turma a fazer origamis (dobradura de papel) inspirados em elementos do conto: pássaro, árvore, índios, meninos. Outra opção é dividir a história em oito partes e a classe em oito grupos. Cada grupo deve desenhar um dos trechos em cartolinas. Monte um mural com as “obras-primas” e a história ganhará lindas ilustrações.

Para oitavo e nono anos

É sugerido que se faça uma pesquisa sobre o povo tzeltal, de onde emergiu a lenda do pica-pau avisador. Os tzeltals vivem até hoje em Chiapas, Estado mais pobre do México, e sua população é composta por vários povos indígenas. Revoltados com a misária da vida rural, eles se organizaram contra o governo mexicano e fundaram, em 1994, o Exército Zapatista de Libertação Nacional. Os zapatistas são guerrilheiros que aparecem em público usando máscaras negras de lã e cujo líder, o subcomandante Marcos, se transformou na mais famosa lenda da região. O tema rende boas discussões nas aulas de História, Geografia e Ética. Nas aulas de Português, a proposta é trabalhar diferentes leituras do texto. Que tal fazê-lo num estilo de narração de jogo de futebol, em ritmo de câmera lenta ou como se fosse um noticiário jornalístico? Se os alunos se empolgarem com essa última categoria, peça que simulem entrevistas com os personagens da história: o pica-pau Ti, os caminhantes, Santo Ildefonso (600-667, espanhol) e seus filhos ciumentos. Para arrematar a atividade, e aproveitando mensagem que a lenda oferece, organize um debate sobre egoísmo. Depois, solicite aos alunos um texto individual com o seguinte tema: “Como podemos combater o egoísmo do mundo?”


Esse texto foi retirado de uma das minhas velhas revistas Nova Escola.